Ricardo Vélez Rodríguez
 
 

EL HOMBRE Y SU OBRA


José Maurício de Carvalho
Fundação de Ensino Superior de São João del-Rei
FUNREI

I

Ricardo Vélez Rodríguez nasceu em Bogotá (Colômbia) em 1943. Realizou os seus estudos básicos no Liceu de La Salle (Bogotá) e cursou na mesma cidade o Bacharelado em Humanidades, no Instituto Tihamer Toth. Obteve o título de Licenciado em Filosofia pela Pontifícia Universidade Javeriana (Bogotá), em 1963. Entre 1965 e final de 1967, fez o curso de Teologia no Seminário Conciliar de Bogotá. Realizou estudos de pós-graduação no Brasil. Na Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro, obteve o título de Mestre em Filosofia, em 1974. Posteriormente, em 1982, obteve o título de Doutor em Filosofia pela Universidade Gama Filho (Rio de Janeiro).

Ricardo Vélez Rodríguez tem dedicado a sua vida profissional à docência universitária e à pesquisa. Na Colômbia iniciou a sua vida docente como professor de Literatura, Teoria Literária e Filosofia, na Faculdade de Filosofia e Letras da Universidade Pontifícia Bolivariana de Medellín, no período compreendido entre 1968 e 1971. Na mencionada Universidade colaborou com destacadas figuras da intelectualidade católica, entre as quais merecem destaque René Uribe Ferrer (1918-1984) y Alberto Restrepo Arbeláez (1935-1976). Em Medellín lecionou também nas Universidades de Antioquia (na Faculdade de Direito e Ciências Políticas) e EAFIT (no Instituto de Humanidades). Em Bogotá, nos anos 1972 e 1973, lecionou Filosofia e Humanidades nas Universidades Externado de Colômbia e Rosário. Nesta última foi assistente do escritor e folclorista Joaquín Piñeros Corpas. De regresso dos seus estudos de Mestrado realizados no Rio de Janeiro, exerceu o cargo de Pró-Reitor de Pós-Graduação e Pesquisa da Universidade de Medellín , entre 1975 e 1978. A partir de Janeiro de 1979 fixou residência no Brasil, inicialmente em São Paulo, onde trabalhou como pesquisador na Sociedade de Cultura Convívio (fundada em 1962 pelo filósofo Adolpho Crippa), tendo sido redator da Revista Convivium. Em 1981 trasladou-se a Londrina (no Estado do Paraná). Na Universidade Estadual dessa cidade (dirigida então pelo renomado educador José Carlos Pinotti) pertenceu ao quadro docente do Departamento de Filosofia, tendo criado, em 1982, o Curso de Pós-Graduação em Pensamento Político Brasileiro. Em 1983 viculou-se ao Programa de Pós-Graduação em Pensamento Brasileiro da Universidade Gama Filho (no Rio de Janeiro), onde trabalha até hoje. A partir de 1985 passou a lecionar também na Universidade Federal de Juiz de Fora, no Curso de Filosofia e no Programa de Mestrado em Pensamento Brasileiro, criado por ele juntamente com Antônio Paim. (Este Programa funcionou até 1996). Entre 1985 e 1990 foi vice-coordenador do Curso de Mestrado em Estudo de Problemas Brasileiros, da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ).

Vélez Rodríguez pertence a várias associações científicas: Academia Brasileira de Filosofia, (com sede no Rio de Janeiro), Instituto Brasileiro de Filosofia (São Paulo), Sociedade Tocqueville (Rio de Janeiro), Instituto de Filosofia Luso-Brasileira (Lisboa), The Planetary Society (Pasadena - Califórnia), The National Geographic Society (Washington), Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro (Rio de Janeiro) e Centro de Estudos Filosóficos de Juiz de Fora. É membro do Conselho Diretor do Centro de Documentação do Pensamento Brasileiro (Salvador - Bahia). Pertence ao Conselho Técnico da Confederação Nacional do Comércio (com sede no Rio de Janeiro).

A atividade de pesquisa de Ricardo Vélez Rodríguez tem-se desenvolvido nos seguintes campos: história do pensamento brasileiro, história do pensamento ibérico e ibero-americano, filosofia das ciências e teoria do conhecimento, filosofia política e história da cultura. No primeiro campo, as contribuições mais importantes têm sido a sua pesquisa sobre o positivismo político no Rio Grande do Sul, que deu ensejo à obra Castilhismo: uma filosofia da República (Porto Alegre, 1980) e a elaboração de várias unidades do Curso de introdução ao pensamento político brasileiro (Brasília, 1982), coordenado por Antônio Paim. No mesmo campo destaca-se também a pesquisa sobre a formação do Estado patrimonial luso-brasileiro; a obra intitulada Oliveira Vianna e o papel modernizador do Estado brasileiro (Londrina, 1997), sintetiza os aspectos essenciais desse estudo. Vélez Rodríguez tem orientado, ao longo dos últimos quinze anos, numerosas teses de doutorado e dissertações de mestrado, nas Universidades Gama Filho e Federal de Juiz de Fora, no terreno da história das idéias filosóficas no Brasil.

No que tange ao pensamento ibérico e ibero-americano, a contribuição mais importante de Vélez Rodríguez consiste na sua colaboração no levantamento da bibliografia brasileira para os cinco volumes do Anuario Bibliográfico de Historia del Pensamiento Ibérico e Iberoamericano (editado por José Luis Gómez Martínez na Universidade de Georgia, entre 1986 e 1993). De outro lado, a pesquisa sobre a formação do Estado Patrimonial, que Vélez Rodríguez iniciou em relação a Portugal e ao Brasil, foi ampliada por ele ao universo hispano-americano. Fruto desse trabalho são as obras intituladas: Liberalismo y conservatismo en la América Latina (Bogotá, 1978) e Estado, Cultura y Sociedad en la América Latina (Bogotá, 1999). Já no terreno da história das idéias filosóficas, deve ser mencionado, outrossim, o ensaio intitulado "A Filosofia em Ibero-América" (publicado no Rio de Janeiro em 1996).

No campo relativo à filosofia das ciências e à teoria do conhecimento, a pesquisa de Vélez Rodríguez tem-se projetado sobre o estudo do impacto produzido pela ciência moderna na gnoseologia, notadamente no pensamento kantiano e neo-kantiano. Os resultados básicos desse estudo foram sintetizados na obra intitulada Tópicos especiais de Filosofia Moderna (Juiz de Fora, 1995) e em vários ensaios.

No que tange à filosofia política, Vélez Rodríguez tem desenvolvido pesquisas sobre a evolução histórica do liberalismo e do socialismo. No relacionado ao Liberalismo, destacam-se duas linhas de trabalho: sobre o liberalismo francês do século XIX e sobre a evolução do liberalismo econômico no século XX. Duas obras sintetizam os resultados dessas pesquisas: A democracia liberal segundo Alexis de Tocqueville (São Paulo, 1998) e Keynes: doutrina e crítica (São Paulo, 1999). Já no que diz respeito às pesquisas sobre o socialismo, duas obras sintetizam os resultados das mesmas: Socialismo moral e socialismo doutrinário (Rio de Janeiro, 1997) e Avanços teóricos da Social-Democracia (Rio de Janeiro, 1997).

No terreno da história da cultura, a pesquisa do autor tem-se desenvolvido conjuntamente com Antônio Paim e Leonardo Prota. O resultado desse trabalho é o Curso de Humanidades (Londrina, 1989 a 1999), que inclui os seguintes volumes: I) Introdução à História da Cultura, II) Política, III) Moral, IV) Religião e V) Filosofia.
 

II

Para explicar o funcionamento das sociedades humanas, Ricardo Vélez contrapôs o desejo de liberdade ao de segurança que, em seu entendimento, coexistem no homem. Os sistemas totalitários refletem o desejo de proteção, os abertos exprimem a expectativa de liberdade. Estes dois aspectos não apenas convivem, eles se alternam na vida concreta das culturas. O patrimonialismo corresponde a um tipo de sociedade fechada muito especial, com características familiares. Para explicar o funcionamento delas, Vélez Rodríguez atualizou o conceito weberiano de estado patrimonial. Esse tem como esteio uma espécie de ética do jeitinho e do atalho, através dela se burlam as regras ordinárias da organização social com o intento de garantir algum benefício pessoal ou familiar aos dirigentes. A metodologia utilizada, ou melhor os conceitos da sociologia weberiana, revelaram-se uma estratégia fecunda para examinar o problema político ibero-americano. A organização político-burocrática destas nações foi por ele examinada à partir de seus mecanismos, evitando, assim, reduzi-la a outros aspectos do universo cultural, como fez, por exemplo, o marxismo. O patrimonialismo revela, segundo o pensador, uma psicologia política denominada de ética patrimonial. O que a tipifica? O fato do homem projetar, nesse espaço cultural, a consciência de seus limites e desejar encontrar no útero protetor da organização política familiar, afetiva, aquilo que o dia a dia parece lhe negar, sugere uma organização social que reduz o povo à massa. Como o patrimonialismo entende o homem? Apenas como parte do grupo social, um parte da massa. É unicamente nesta condição que o homem pode ser considerado agente da história e somente no grupo que adquire sentido sua liberdade civil.

O que é, afinal, o patrimonialismo a que se refere Ricardo Vélez? Na sociologia weberiana correspondia a um tipo de dominação política tradicional caracterizada pelo fato do soberano organizar o poder político de forma análoga a seu poder doméstico (Ricardo Vélez Rodríguez. Oliveira Vianna e o poder modernizador do estado brasileiro. Londrina: Ed. UEL, 1997. p. 22). Esta forma de exercício da autoridade sofre modificações ao longo da história. De uma perspectiva puramente histórica tanto é possível que ela evolua em direção à formas de governo que adotam a democracia representativa, quanto simplesmente modernizem a administração burocrática sem caminhar neste sentido.

Esta forma administrativa, o estado patrimonial, teria prevalecido na Rússia e nos países do Leste Europeu, tal foi a compreensão de Max Weber. A leitura weberiana foi substancialmente enriquecida pelos weberianos brasileiros, que a tornaram muito mais complexa ao aplicá-la as circunstâncias ibero-americanas.

Ricardo Vélez explicou como o conceito weberiano foi tratado e ampliado pelos estudiosos brasileiros. Afirmou que coube a Raimundo Faoro levantar a hipótese weberiana para explicar os problemas vividos pelo Brasil, mas o fez de modo defeituoso, eivado de vícios, porquanto mantinha-se sob a inspiração de uma visão liberal oitocentista. Simon Schwartzman foi outro estudioso que deu ao tema grande atenção, sendo o seu mérito olhar a organização burocrática nacional sem preconceitos. Foi, contudo, Antônio Paim que associou o projeto modernizador do patrimonialismo brasileiro às reformas pombalinas e tirou daí maiores conseqüências. Finalmente, Ricardo registrou a contribuição de Wanderley Guilherme dos Santos para quem a vertente modernizadora do patrimonialismo se arvora na condutora da modernização das instituições políticas, notadamente as liberais. A principal característica desta versão patrimonial, que Guilherme dos Santos denominou de autoritarismo instrumental, é a crença no desenvolvimento planejado ou sistemático do grupo social, e que cabe ao estado o papel de agente deste desenvolvimento. O teórico que melhor formulou esta filosofia política foi, em seu entendimento, Oliveira Vianna. Ricardo acompanhou, neste ponto, a Guilherme dos Santos para quem o próprio movimento de 64 reflete esta forma de autoritarismo, tendo como ideal último a conquista das instituições liberais. O fechamento do sistema político correspondeu apenas a um estágio transitório do movimento, enquanto a democratização da economia não se completava.

Ao examinar o pensamento de Oliveira Vianna, Ricardo Vélez observou que o modelo proposto estava orientado para a abertura política e a consolidação da democracia. Semelhante conclusão foi extremamente original em relação às idéias de Max Weber e Ricardo Vélez soube tirar dela importantes conseqüências. Vejamos como se valeu dessas referências para marcar uma posição singular no exame da organização e da tradição político-administrativa da sociedade luso-brasileira.

Historicamente, explicou Ricardo Vélez, o patrimonialismo desenvolveu-se como uma espécie de centripetismo privatizante, estruturado em torno da figura do monarca, e foi herança política de um meio cultural igualmente absorvente, a cultura muçulmana. Ali, como na sociedade ibérica, a religião universalista e o dirigente protetor, constituem o contraponto de uma vida insegura e instável. A novidade anunciada pelo estudioso em pauta é que, para ele a opção patrimonial não destruiu a tradição contratualista ibérica, afastando-se da clássica interpretação de Alexandre Herculano. Assim, a idéia de patrimonialismo pareceu-lhe uma vertente destacada, porém secundária em relação ao espírito da liberdade, que entre os ibéricos se exteriorizou no direito consuetudinário visigótico, sob cujas bases desenvolveu-se, hoje em dia, a democracia ibérica. O que permitiu que o pensador se afastasse da clássica solução de Herculano? Parece-nos que sua interpretação filosófica da evolução do patrimonialismo, que, para ele, não possuía caráter estrutural e desfecho inevitável. A sua leitura do patrimonialismo modernizador revelou que o movimento podia caminhar em direção a uma sociedade aberta. O próprio patrimonialismo ibérico não teria destruído o espírito de liberdade, herança do direito visigótico. É isto que dá ao pensamento de Vélez Rodríguez uma nítida coloração filosófica, que não é tão evidente na interpretação mais sociológica, que Herculano realizou da sociedade ibérica. Como as instituições sociais espelham a dualidade encontrada no homem, a liberdade e o desejo de proteção tanto se alternam como convivem na vida social. As sociedades se singularizam pelo modo como combinam estes aspectos do mundo do existente.

O estudo do patrimonialismo revelou-lhe que a moral social desenvolvida no Brasil foi verticalmente formulada. Não importa se elaborada pela Igreja Católica ou pelo Estado Centralizador, em ambos os casos ficaram fora de sua elaboração as forças sociais. Para Ricardo Vélez a superação do patrimonialismo supõe a capacidade de modificar semelhante realidade. Ele enxergou no movimento que afastou o Presidente Collor da Presidência da República um início desta nova realidade. Assim, acabou concluindo, como outros filósofos brasileiros também o fizeram, pela urgência de levarmos adiante a discussão dos princípios da moral social, bem como com o pressuposto de que ela deva ser formulada consensualmente (Ricardo Vélez Rodríguez. "Notas sobre a moral social na cultura social brasileira". Carta Mensal 43.506 [1997]: 159-176.)

A referência às modificações da cultura, entendida como projeção de aspectos do homem, revela uma inegável preocupação com o modo de ser do homem. A ênfase foi atribuída à atividade. O mundo objetivado da cultura está em contínuo processo de modificação, o que permite, por exemplo, que a sociedade ibérica contemporânea se organize e se reformule continuamente, tendo como pano de fundo os grandes temas da cultura ocidental. O dinamismo das culturas é o dinamismo do próprio homem, podemos concluir tomando por base as reflexões do filósofo. Essas questões propostas pelo pensador projetam-no como um estudioso de destaque da cultura e dos problemas humanos.

[La segunda parte se publicó anteriormente en, José Maurício de Carvalho, Contribuiçäo Contemporânea à História da Filosofia Brasileira. Balanço e Perspectivas. Londrina: Editora UEL, 1998.]
 
© José Luis Gómez-Martínez
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